XX COLÓQUIO DE OUTONO 2018
«Paz às cabanas! Guerra aos palácios!», este célebre lema d’O Mensageiro de Hesse (1834), um dos primeiros panfletos pré-comunistas (Büchner / Weidig) que exorta os camponeses à revolta, inspirou Marc Chagall, em 1918, portanto há cem anos, para a criação de um mural num edifício público. Este mural, tal como inúmeros outros, fazem parte da expressão artística ligada à Revolução de Outubro – uma arte interventiva, comprometida com a ação coletiva. Este exemplo ilustra dois aspetos centrais da temática global do XXº Colóquio de Outono do da Universidade do Minho:
(1) a paz e a liberdade são conceitos utilizados ao serviço de visões e no seio de discursos que se levantam, por um lado, contra estruturas de poder estabelecidas e, por outro, também contra os movimentos que ameaçam a ordem antiga – basta pensar no movimento anticomunista Paix et Liberté que inundou a França dos anos 50 com cartazes e panfletos;
(2) a intervenção de artistas plásticos, músicos e escritores em prol da paz e da liberdade corresponde a um conceito de arte que abandona os espaços e os circuitos restritos que lhe são tradicionalmente reservados para intervir na rua, unindo-se à ação, conferindo menor importância à dimensão estética em si ou negando-a até.
A Revolução de Outubro está intimamente interligada com o sucessivo fim da Grande Guerra, por inspirar movimentos pacifistas e revolucionários por toda a Europa que pretendiam libertá-la de estruturas de poder e de exploração consideradas responsáveis pela escalada de violência e de horrores nunca antes vistos. A data de 9 de novembro de 1918 marca o fim do Império Alemão e, ao mesmo tempo, o início do levantamento popular espartaquista que acabará no assassinato de Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht, em 15 de janeiro de 1919, e em lutas fratricidas entre socialistas e comunistas. São figuras icónicas de uma luta pela liberdade que evoca a memória de outro ídolo, Mikhail Bakunin, e os movimentos anarquistas em volta da Liga da Paz e da Liberdade que teve há 150 anos, em setembro de 1868, o seu Congresso em Berna.
A oposição a outra Guerra, a Guerra de Vietnam, contribuiu muito para o famoso Summer of Love, de 1967, que por sua vez, inspirou a onda de movimentos de juventude que ficou na História Contemporânea etiquetada como Maio de 68. Tal como cinco décadas antes, e ainda com uma maior criatividade transmedial, a arte invadiu os espaços públicos levando a uma hibridização destes com o espaço privado e o íntimo, nomeadamente ao nível da revolução sexual, acrescentando aos conceitos de Paz e Liberdade o de Amor. Indissociáveis de tais dinâmicas são também os movimentos contra a discriminação de género e raça que se podiam rever na expressão “I prefer dangerous freedom over peaceful slavery”, como disse Thomas Jefferson, inspirando-se numa velha expressão em latim de autoria desconhecida; outros se lembrarão da frase “Je préfère une liberté dangereuse plutôt qu’un esclavage tranquille” que aparece em Du contrat social ou Principes du droit politique (1762), de Jean Jacques Rousseau. O exemplo ilustra a migração de reflexões sobre os conceitos de paz e liberdade, só à primeira vista em plena sintonia, porém abertos a múltiplas interpretações, dependendo de contextos históricos sempre diferentes mas comparáveis.
Oradores convidados:
- Wolfram Eilenberger, filósofo e autor do livro Zeit der Zauberer (2018; Time of the Magicians: The Great Decade of Philosophy 1919-1929) [CV], patrocinado pelo Goethe Institut – Portugal e pela Embaixada da República Federal da Alemanha [Abstract]
«From 1919 to 1929 - the magical decade after WW I: Heidegger, Wittgenstein, Benjamin, Cassirer» - Tomás Albaladejo (profesor catedrático da Universidad Autónoma de Madrid). [CV]
«Guerra, paz, libertad: narratividad dialéctica y literariedad» - Carlo Salzani, investigador (Vienna). [Abstract]
«Walter Benjamin reads Mickey Mouse: Cinema, Technology and the Posthuman» - Burghard Baltrusch (Professor Titular da Universidade de Vigo, I Cátedra Internacional José Saramago). [CV]
«Guerra e violência de género em O Ano de 1993 de José Saramago e nas ilustrações de Graça Morais» - João Nuno Azambuja, autor dos livros Era Uma Vez um Homem e Os Provocadores de Naufrágios. [CV]
«Política: ação ou reação? A clarividência de Aristóteles» - António Louçã (historian & journalist). [Abstract]
«Alemanha 1918 a 1923 – um missing link na História da luta pelo Socialismo»
Comissão Organizadora:
- Orlando Grossegesse (Universidade do Minho, Portugal)
- Cristina Flores (Universidade do Minho, Portugal)
- Micaela Ramon (Universidade do Minho, Portugal)